A primeira parte do encontro virtual foi uma meditação conduzida pelo cardeal português José Tolentino de Mendonça, arquivista do Arquivo Apostólico do Vaticano e bibliotecário da Biblioteca Apostólica Vaticana. Sua pregação partiu “da pausa reflexiva que Jesus faz em seu discurso”, considerando o contexto da pandemia que o mundo enfrenta na atualidade, “a dureza, a dificuldade, o pesado e sofrido o caminho que o povo de Deus está fazendo nessa hora”.
Essa pausa citada por dom Tolentino é um tipo de comunicação que Jesus utiliza algumas vezes nos Evangelhos, “como que precisasse escutar melhor, ajustar o discurso à realidade”. O cardeal então toma do capítulo 13 do Evangelho de São Lucas o versículo 18: “’A que é semelhante o Reino de Deus, e com que poderei compará-lo?’”.
Chamando a aprender e a valorizar este recurso, o cardeal apontou três aprendizados. O primeiro é que nem sempre é fácil interpretar a realidade em tantas situações nas quais o real “resiste ao nosso modo de o descrever. A realidade põe em crise nosso discurso”.
O segundo elemento é que para explicar o Reino de Deus e a vida dos homens em profundidade, nós precisamos de parábolas, de comparações. “As parábolas, sobretudo num tempo difícil como esse, abrem espaço para um discurso não teórico, mas existencial e não simbólico”. Na sequência, dom Tolentino cita a recente encíclica do Papa Francisco, Fratelli Tutti, que “parte da pandemia para indicar o caminho da Igreja e do mundo”.
A terceira lição é que “a finalidade do discurso eclesial deve ser ganhar corações para o Reino de Deus, em vez de ficar em exercícios de retórica”. Para o cardeal, a retórica esconde a realidade debaixo das palavras, o que é diferente da persuasão evangélica. Esta, procura gerar no sujeito a autoconsciência da sua história, o kairós dentro do cronos. “Este momento dramático é também o momento do kairós, momento de salvação e de graça. A interrogação de Jesus mostra como é necessária uma hermenêutica profética da história”, afirmou.
O cardeal José Tolentino seguiu com as reflexões sobre a necessidade de fazer perguntas neste contexto da pandemia, incentivando que seja levada para os encontros orantes “a grande tarefa de fazer ecoar as perguntas e entender essa hora como hora de sintonizar o espaço reflexivo e orante que Jesus nos ensina”. A figura do Papa Francisco também foi destacada como aquele que tem ajudado a Igreja com uma série de parábolas, como o momento de oração realizado em março na praça de São Pedro vazia.
“Ele quis fazer aquele momento de oração na praça de São Pedro vazia. É como se o mundo estivesse vazio, como se as ruas estivessem despejadas, todos os espaços públicos vazios, aquele vazio era o vazio que a humanidade e a Igreja estavam sentindo. O vazio tornou-se uma parábola. Uma das parábolas que o Papa quis abraçar, em vez de negar, é a parábola do vazio, da dificuldade”, refletiu, apontando na sequência o texto Evangelho sobre a tempestade acalmada.
“Um elemento chave é o fato de todos estarem juntos na mesma barca. O Papa explorou também essa parábola, de estarmos todos no mesmo barco, a remar juntos. E todos precisamos de mútuo encorajamento. Então, naquela simbólica celebração, o Papa ofereceu duas imagens, uma lê evangelicamente a outra”, disse.
Comunicados
As atividades da manhã desta quarta-feira, após a meditação do cardeal Tolentino, consistiram em comunicados e partilhas. O arcebispo de Belo Horizonte (MG) e presidente da CNBB, dom Walmor Oliveira de Azevedo, recordou as diversas iniciativas da Igreja no Brasil durante a pandemia, comparando com o “broto de esperança” do tronco de Jessé da promessa no livro do profeta Isaías.
“Cada irmão bispo, cada diocese, com seus evangelizadores e ministros, nesse tempo de pandemia, com muitas respostas bonitas de confiança e trabalhos realizados. E nessa hora, cada um pode repassar esses meses exigentes, sobretudo o sofrimento dos pobres, dos sofredores, das famílias enlutadas. Tudo isso é um broto de esperança que colocamos diante de Deus”, afirmou.
Dom Walmor citou iniciativas como os avanços em torno do tema central da próxima Assembleia Geral da CNBB; o trabalho de gestão na sede e nos regionais da conferência, com “avanços importantes” do ponto de vista do equilíbrio administrativo e financeiro; a implementação do Pacto pela Vida e pelo Brasil; a presença da CNBB no Observatório de Direitos Humanos do Poder Judiciário; e o processo de construção do novo estatuto da CNBB.
Mensagem ao Papa e ao povo brasileiro
Os bispos também preparam uma mensagem que será enviada para o Papa Francisco, como é realizado a cada ano, por ocasião das assembleias gerais. O arcebispo de São Paulo (SP), cardeal Odilo Pedro Scherer, coordenou a construção do texto que está baseado na proximidade dos bispos do Brasil com o Papa e no agradecimento pela proximidade do Santo Padre com o Brasil. Uma mensagem ao povo brasileiro por conta da pandemia do novo coronavírus também foi preparada pelos bispos.
Ação evangelizadora da Igreja na pós pandemia
No período da tarde, a reunião dos bispos seguiu com uma reflexão da teóloga e professora e decana do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio, Maria Clara Bingemer. Coube à professora apresentar pontos para uma reflexão sobre a ação evangelizadora da Igreja num cenário pós pandemia. Ela destacou cinco pontos: a) Retomar o luto com o olhar pascal; b) Parceria mais estreita com a ciência; c) Abrir mais espaço para a beleza e arte como elementos para reencantar os corações; d) Revalorizar o espaço doméstico e a experiência da Igreja nas casas; e) Cuidado da terra e cuidado com a casa comum.
Partilhas
Na sequência da reunião, os bispos deram continuidade da primeira parte de uma série de partilhas sobre as atividades de Comissões, regionais e pastorais iniciada pela manhã. A presidência da CNBB apresentou uma atualização da campanha É Tempo de Cuidar e também um balanço sobre a gestão administrativo-financeira da CNBB no contexto da pandemia.