Segundo informação fornecida à imprensa nacional pela Secretaria de Administração Penitenciária (Seap) de Manaus (AM) quarenta presos foram encontrados mortos nas seguintes unidades prisionais: Instituto Penal Antônio Trindade (Ipat) – 25 mortos; Unidade Prisional do Puraquequara (UPP) – 6 mortos;Centro de Detenção Porvisória Masculino(CDPM 1) – 5 mortos; e no Compaj – 4 mortos.
Nota da Pastoral Carcerária
Na noite desta terça-feira, 28 de maio, a Pastoral Carcerária Nacional em conjunto com a Pastoral Carcerária do Amazonas publicou uma Nota na ual fala da tragédia de Manaus e pede providências das autoridades: “É na dor do luto e na esperança da luta por uma vida libertada do sistema prisional que a Pastoral Carcerária Nacional vem se posicionar frente a mais um massacre fruto do aprisionamento em massa, do descaso com vidas tidas como descartáveis, da ganância de empresas privadas e do genocídio protagonizado pelo Estado brasileiro“.
A Nota traz uma atualização do número de mortes, agora 55, e prossegue:”Essas mortes não acontecem por conta da tão alardeada briga de facções, narrativa traiçoeira que despejasobre parcelas da população prisional a responsabilidade por episódios que são as consequênciasinevitáveis de um sistema prisional cuja função principal é a produção de dor, sofrimento e mortes; e simpela manutenção da lógica de encarceramento em massa e banalização das vidas, de aprisionar e exterminaruma população indesejável, em sua maioria pobre e negra, o que reafirma a responsabilidade inequívoca doEstado pela barbárie”.
Memória: mortes em 2017
A Pastoral Carcerária Nacional lembra outra Nota que emitiram em 2017, quando Manaus viveu situação semelhante: “Em nota feita em 2017, quando ao menos 56 presos foram mortos no Compaj, junto a outros 75 em outros presídios do Amazonas, Roraima e Rio Grande do Norte , a Pastoral Carcerária já afirmava:’Se a opção que alertávamos há tempos era pelo desencarceramento ou barbárie, o Estado de forma clara e reiterada optou pela barbárie’. Esta se materializa tanto nas violações cotidianas e nas mortes naturalizadas pelas estatísticas, como nos massacres em massa do passado e do presente. Como pontuado na época, ‘já não se trata mais de uma crise, mas de um projeto’.”
“O que acontece em Manaus agora, assim como os massacres de 2017, o Massacre do Carandiru em 1992 e tantos outros, não são uma exceção do sistema prisional, e sim parte do seu funcionamento. Não se trata, portanto, de uma ausência do Estado, mas de sua presença, por meio de um gigantesco sistema de encarceramento e controle, que coloca o Brasil na posição de 3º país que mais encarcera no mundo“, afirma a Nota.
Unidades prisionais privatizadas
A Nota da Pastoral Carcerária denuncia: “As mortes destes últimos dias ocorrem em diferentes unidades prisionais privatizadas, todas administradas pela mesma empresa, a Umanizzare. Em relatório divulgado em 2017 o Ministério Público do Amazonas revelou que a empresa recebe do Estado R$ 4,7 mil por preso, valor muito acima da média nacional. E ainda, mesmo com a grande quantidade de mortos nas unidades da Umanizzare em 2017, o Governo do Amazonas, em 2018, prorrogou os contratos com a empresa . Apenas para o Compaj, unidade com maior número de mortos, o Estado paga um valor mensal superior a 5 milhões de reais“.
“Em 2014“, lembra a Pastoral Carcerária, “a empresa utilizou parte do dinheiro recebido para realizar doações significativas para campanhas de candidatos ao Governo do Estado e à Assembleia Legislativa . Que interesses têm a Umanizzare em certos mandatos e projetos pautados? Preocupada com o avanço da privatização dos presídios, a Frente Estadual pelo Desencarceramento de São Paulo pontuou, sobre a relação imbricada entre o interesse das empresas em prisões e a aprovação de projetos punitivistas: ‘aliados (…) operam uma lógica perversa em que, quanto mais presos houver, mais dinheiro essas empresas recebem, afinal, transforma-se a gestão prisional em fonte de lucro e os presos em mercadoria’. Mesmo com grandes volumes de verbas, as unidades privadas se encontram em condições absolutamente degradantes, e em regra são as famílias que fornecem itens básicos para garantir a sobrevivência das pessoas encarceradas, evidenciando como não há presídio – seja público ou privado, com maior ou menor gasto – capaz de garantir a vida e a integridade dos seus custodiados“.
Palavra da empresa Umanizzare
A Nota da Pastoral Carcerária registra ainda que a empresa responsável pelos presídios, a Umanizzare, em nota, afirmou que “trabalha em conjunto com a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária – SEAP no apoio necessário à retomada da normalidade dentro das unidades”. Mas, a Pastoral lembra, no entanto, que “o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura realizou uma visita ao Compaj em fevereiro de 2018 e constatou, na normalidade do funcionamento da unidade, que havia racionamento de água, ausência de oferta de trabalho, insuficiência de colchões, falta de medicação, má qualidade dos kits de higiene e irregularidade na entrega, falta de horário e espaço adequados para a realização de visitas íntimas e religiosas com a privacidade e tempo necessários , cenário semelhante ao que se observa no cotidiano em cada presídio pelo país, na escuridão das celas fora do espetáculo dos massacres“.
Apelo da Pastoral
A Nota finaliza: “Em solidariedade às famílias de tantas vítimas do sistema prisional – as 55 que agora se foram e as mais de 700 mil que lutam cotidianamente para sobreviver em um sistema de produção de morte – a Pastoral Carcerária Nacional, guiada pela missão de Jesus de Nazaré de libertar as pessoas privadas de liberdade (cf. Lc 4,18), reafirma seu compromisso com a vida e reforça a importância de uma comoção social ampla frente a mais um caso de genocídio promovido pelo Estado brasileiro. Negligenciar essa luta necessária e urgente por um mundo sem prisões é compactuar com a barbárie“.
(Foto: EBC)